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Memórias de um velho-menino
Parte III
            Hoje, trago à recordação de um historia que me foi contada quando ainda menino, mas que serve perfeitamente para os dias atuais, onde o egoísmo e a ânsia em ter cada vez mais, suplanta o objetivo do ser.
            Era uma vez, há muitos e muitos anos, em uma pequena, mas prospera cidade do interior de um país qualquer, preferencialmente europeu, havia um casal com alguns filhos que viviam em extrema pobreza, nada tendo de seu além de uma velha cabana de madeira, cujas tábuas já carcomidas pelos anos, reclamavam tapumes aqui e ali, mais parecendo uma colcha de retalhos, além de pequeno roçado onde plantavam e colhiam a subsistência da família.
As frestas nas paredes, tapadas com pedaços de tábuas tão velhas quanto, deixavam passar o vento frio invernal e do teto gotejavam a umidade da chuva, mas a família ali se sentia acolhida e procuravam encontrar nas dificuldades o caminho para a solução dos problemas que os rodeavam.
            Um dia, o filho mais velho, ao limpar um córrego que passava nos fundos da pequena roça, visando torna-lo mais límpido, se deparou com uma estranha pedra dentre o cascalho que atirava com a pá para fora do leito do regato.
            Curioso, apanhou a pedra e por acha-la bonita colocou em um dos bolsos da calça continuando o trabalho até a tardezinha, quando regressou ao lar e lá chegando mostrou a pedra ao velho pai, que logo identificou como um diamante imenso.
            Eufórico, abraçou o filho e todos os demais familiares, dizendo que aquela pedra seria a redenção financeira da família, pois devia valer uma verdadeira fortuna.
            Logo ao amanhecer do dia colocou o pé no caminho em direção à cidade onde suas expectativas foram suplantadas varias vezes, pois o valor que havia pensado inicialmente era ínfimo ante o verdadeiro valor da preciosa pedra.
Com a fortuna em mãos, comprou uma bela casa na cidade para onde se mudou com a família, abriu um grande comercio e passou o resto de seus dias sem preocupações financeiras, não sem antes mostrar aos filhos que, apesar da sorte lhes haver sorrido, deveriam continuar a trabalhar, ensinando que o trabalho enobrece e dignifica o ser humano.
O filho que encontrou a pedra queria demolir o velho casebre e tocar fogo em tudo, mas o sábio pai não permitiu, pois aquela cabana havia sido o lar de todos ao longo de muitos e muitos anos, abrigando-os da inclemência do inverno, toscamente, mas aquecendo a família e os protegendo.
Deveria ficar do jeito que estava, até mesmo com os velhos móveis, uma espécie de homenagem pelos anos ali vividos.
Antes de encostar a porta, o velho redigiu um bilhete e o colocou sobre a tosca mesa e agradecendo a Deus, se despediu da antiga moradia com lágrimas nos olhos, num pranto mudo repleto de gratidão.
Passados alguns dias, eis que uma pobre e desabrigada família se acerca do casebre na esperança de conseguir um pedaço de pão com os moradores, pois não se alimentavam há dias.
O homem, magro, roupas surradas, tocou de leve com os nós dos dedos a porta rustica, que se moveu ao toque, entreabrindo e mostrando o interior do casebre.
Receoso, avançou chamando pelos proprietários sem ouvir qualquer resposta. Relanceando o olhar pelo interior, divisou o papel sobre a mesa e para lá se dirigiu, vacilante, mas curioso.
Ao ler as poucas linhas traçadas precisou se amparar para não cair, dado a surpresa que se descortinava ante seus atônitos e lacrimejantes olhos, porque, ali, em suas mãos, se encontrava a resposta às suas preces traçadas em poucas linhas:
“Caro amigo, caso você encontre este bilhete e se estiver precisando de um teto que o abrigue, peço, em nome de Deus, que se aposse deste velho e querido casebre, meu lar por vários anos, e que seja, a partir deste instante, o seu lar. Cuide bem dele e seja feliz.”
Chocado e atordoado, chamou sua família para perto da mesa e ali agradeceu a providencia divina que os havia presenteado com a tão esperada moradia, orando pelo desconhecido benfeitor com votos de paz e saúde.
Ao final da historia aprendi a lição contida em sua narrativa: a gratidão não pode ser menor do que a generosidade.
Porto Velho, RO – agosto de 2014
           

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